IAP, referência do que um órgão ambiental jamais deve ser

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Foto de Daniel Castellano_Arquivo Gazeta do Povo

Parece que tudo é lindo, está em perfeito estado de funcionamento e que o Instituto Ambiental do Paraná (IAP), com seus 25 anos de idade, promove todos os serviços necessários à comunidade paranaense, garantindo um ambiente equilibrado, justo e ecologicamente correto. Mas, há tempos, isso não acontece.

É fato que existem excelentes profissionais trabalhando no IAP e este texto não busca atacar servidores que desenvolvem seus trabalhos com ética, lisura e respeito aos ambientes naturais e à sociedade paranaense. No entanto, dizer que o IAP é referência, como foi salientado pelo próprio instituto em 20 de julho, quando completou duas décadas e meia de atuação, é um ato ousado, exagerado e até mesmo mentiroso.

Diversos estudos mostram que nos últimos anos o Paraná vem desmatando desenfreadamente a Mata Atlântica. Números já bastante divulgados por entidades como a SOS Mata Atlântica e os esforços do Ministério Público do Estado do Paraná (MPE) em lançar e manter o programa Mata Atlântica de Pé, para identificar e mitigar práticas ilícitas contra esse bioma, são exemplos dessa situação.

A condição atual dos Campos Naturais, por exemplo, nos locais onde o ecossistema ainda luta para sobreviver – isolado em ilhas pressionadas pela expansão desenfreada da soja e do plantio de espécies exóticas, por exemplo – é um exemplo claro da inoperância do IAP em fiscalizar e punir irregularidades. Ao analisar imagens orbitais, como o Google Earth, é possível identificar milhares de hectares de campos nativos que foram descaracterizados nos últimos anos, principalmente pelo avanço das atividades acima citadas, inclusive dentro de Unidades de Conservação, que deveriam estar protegidas pela lei.

Além disso, centenas de quilômetros de drenos instalados em campos úmidos nativos considerados de preservação permanente segundo o Novo Código Florestal parecem não existir para as fiscalizações do IAP. Com o Cadastro Ambiental Rural (CAR), há uma expectativa de que esses crimes sejam reconhecidos e os responsáveis, punidos; no entanto, a esperança de que isso ocorra com grande agilidade, transparência e eficiência não é das maiores.

Em relação às Unidades de Conservação, é cômico acreditar que o IAP se preocupe com esse tema como diz fazer, uma vez que o próprio presidente do instituto solicitou o estudo para a Fundação ABC reduzir em 70% os limites da Área de Proteção Ambiental (APA) da Escarpa Devoniana. A situação resultou na proposição, por deputados paranaenses, do Projeto de Lei 527/2016, que tramita na Assembleia Legislativa do Paraná. Se aprovado, 2,6 bilhões de metros quadrados de área protegida serão suprimidos para dar espaço a novos plantios de soja, espécies exóticas, criação de gado e práticas de mineração.

A falta de equipamentos e recursos para as Unidades de Conservação é outro ponto que revela a fraqueza do órgão, reflexo de um sucateamento planejado pelo atual governo do estado, mais interessado em manter a “política da boa vizinhança” com entidades como a Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) e a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep).

O licenciamento ambiental também é um “calcanhar de Aquiles” do IAP. Basta observar a situação da descentralização do processo nos últimos anos. Por incentivo do órgão, diversos municípios do Paraná passaram a realizar o procedimento, mas sem estrutura física e financeira para tanto. Exemplo disso está no município de Ponta Grossa, que utilizou recursos do Fundo Municipal de Defesa Ambiental (Fumdam) para comprar equipamentos e estruturar a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, porque a prefeitura não repassou recurso suficiente para a pasta.

Isso tudo sem detalhar as diversas denúncias contra atuais e antigos servidores do IAP, envolvidos em práticas fraudulentas relacionadas a processos de liberação de licenças ambientais, prevaricação e envolvimento em diversos tipos de irregularidades ambientais, desde tráfico de animais até a fragilização de Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Destacam-se, ainda, os diversos problemas em processos de licenciamento ambiental de grandes empreendimentos, como os de usinas hidrelétricas, aterros sanitários e indústrias, envolvendo a ausência de estudos específicos como, por exemplo, levantamentos espeleológicos, bem como a forte presença de influências hierárquicas superiores na análise dos estudos, deixando de lado critérios técnicos e adotando-se medidas obscuras durante as análises.

Há mais de duas décadas o IAP não promove novos concursos públicos. Grande parte de seu quadro de servidores é hoje comissionada ou indicada por interesses políticos. Os colaboradores que fizeram o concurso estão prestes a se aposentar, e os que fazem críticas ou têm pretensões de recuperar a seriedade da instituição sofrem com fortes represálias.

Fatos como esses, portanto, não só comprometem fortemente a credibilidade da instituição como comprovam que é impossível acreditar que IAP seja a referência positiva que defende representar. Na verdade, o Instituto Ambiental do Paraná serve hoje mais para ser referência daquilo que um órgão ambiental não deve nunca se tornar.

 

Henrique Pontes, geógrafo, técnico em Meio Ambiente, mestre em Gestão do Território e doutorando em Geologia, é membro efetivo do Grupo Universitário de Pesquisas Espeleológicas (Gupe).

Acesse este artigo na Gazeta do Povo.

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