Quando o Paraná ardeu em chamas

Situação levou o governo do Paraná a decretar estado de calamidade pública Crédito: Reprodução

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Fotos do livro “Incêndios Florestais – Controle, Efeitos e Uso do Fogo” mostram drama vivido pela população paranaense. Crédito: Reprodução
Fotos do livro “Incêndios Florestais – Controle, Efeitos e Uso do Fogo” mostram drama vivido
pela população paranaense. Crédito: Reprodução

A Austrália, com mais de um bilhão de animais mortos. A Amazônia, com mais de sete milhões de hectares queimados, segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Prejuízos ambientais, sociais e econômicos incalculáveis causados por incêndios florestais.

Entre o fim de 2019 e o início de 2020, esses locais arderam em chamas. Queimadas chocantes e cenas tristemente inesquecíveis que rememoram um drama parecido já vivido pelo Paraná.

O ano era 1963. Pelo menos, 110 pessoas morreram em decorrência de uma estiagem prolongada seguida de um enorme incêndio que cobriu o Estado por gigantescas cortinas de fogo.

Os incêndios atingiram 128 cidades do Paraná e destruíram nada menos que 10% do território paranaense. Milhares de pessoas ficaram feridas, desalojadas e desabrigadas.

Era agosto. Uma queda da temperatura provocou fortes geadas, que deixaram o campo extremamente seco. Como era de costume, lavradores fizeram pequenas queimadas para “limpar” o terreno. No entanto, a estiagem da época estava fora do comum, o que fez com que as chamas se alastrassem com facilidade e muita rapidez a outras localidades.

O resultado foi um dos piores incêndios de que se teve notícias no Brasil até hoje. Um dos maiores do mundo. Ao todo, 128 cidades – principalmente das regiões norte, central e dos Campos Gerais – foram afetadas. Dois milhões de hectares foram devastados pelo fogo, que perdurou até meados de setembro.

Foram destruídos 20 mil de hectares de plantações, 500 mil de florestas nativas e 1,5 milhão de campos e matas secundárias. Aproximadamente oito mil imóveis – entre casas, galpões e silos – viraram cinzas. Cerca de 5,7 mil famílias (a grande maioria formada por trabalhadores rurais) ficaram desabrigadas. Tratores, equipamentos agrícolas e incontáveis veículos foram atingidos pelas chamas. O Paraná estava em flagelos.

Situação levou o governo do Paraná a decretar estado de calamidade pública Crédito: Reprodução
Situação levou o governo do Paraná a decretar estado de calamidade pública
Crédito: Reprodução

Em 14 de agosto de 1963, foram noticiados os primeiros focos de fogo em Guaravera, Paiquerê e Tamarana, que eram distritos de Londrina. As regiões do Paraná que mais sofreram com a tragédia foram as cidades de Ortigueira, Curiúva, Tibagi, Sapopema, Arapoti, Cândido de Abreu, Barbosa Ferraz, Telêmaco Borba, Reserva, Ivaiporã, Roncador, Palmital, Pitanga, Piraí do Sul, Castro, Ponta Grossa, Faxinal, Campo Mourão e Inajá.

As chamas se estenderam a Sengés e Jaguariaíva, o que provocou a perda de, pelo menos, 15 milhões de araucárias na região, sem contar os danos irreversíveis causados à floresta que abriga essa importante espécie ameaçada de extinção. O relatório do governo estadual da época apontou que o município de Ortigueira teve 90% da área queimada.

Mais de 70% das reservas florestais das Indústrias Klabin de Papel e Celulose, cultivadas em uma fazenda de Tibagi, se perderam. Só nesse local, 200 milhões de araucárias foram destruídas. As perdas em todo o Paraná foram, na época, calculadas em 200 milhões de cruzeiros.

Ajuda

A ajuda para combater os incêndios veio de outros estados, com a oferta de helicópteros e aviões. Cerca de quatro mil membros do Exército, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros tentavam evitar um cenário ainda pior – se é que isso ainda parecia possível. Também foram enviados ao Paraná medicamentos, ferramentas agrícolas, roupas e alimentos de diversos países, como Estados Unidos, Itália, Japão, China e Suíça. No entanto, o fim do incêndio acabou naturalmente. Foi somente com a volta da chuva – como ocorreu recentemente também na Amazônia e na Austrália – que a situação dramática passou a ficar mais controlada.

Fotos do livro “Incêndios Florestais – Controle, Efeitos e Uso do Fogo” mostram drama vivido pela população paranaense. Crédito: Reprodução
Fotos do livro “Incêndios Florestais – Controle, Efeitos e Uso do Fogo” mostram drama vivido pela população paranaense. Crédito: Reprodução

Estado de calamidade

Em 28 de agosto de 1963, o governo do Paraná decretou “Estado de Calamidade Pública”. O fato foi motivado pela destruição provocada pelos incêndios e pelos problemas sociais trazidos com ele, como o alto índice de desabrigados e desempregados. A atividade agrícola na época ficou, praticamente, parada em todo o Paraná.

O governador Ney Braga chegou a contratar, em outubro daquele ano, por 300 milhões de cruzeiros, uma equipe dos Estados Unidos para auxiliar no desenvolvimento do Estado, que sofria com os efeitos da tragédia.

Os peritos norte-americanos orientaram os produtores rurais para que não fizessem mais uso de queimadas para “limpar” o terreno antes do plantio. O “dia do fogo”, promovido no dia 10 de agosto por fazendeiros do Paraná indica que, anos depois, a orientação foi desconsiderada, causando danos inimagináveis à Amazônia.

Outros incêndios

O incêndio florestal registrado no Paraná é um dos maiores e com consequências mais drásticas de que já se teve notícias em todo o mundo. Segundo o livro “Incêndios florestais – controle, efeitos e uso do fogo”, dos pesquisadores Ronaldo Viana Soares e Antônio Carlos Batista, o incêndio de Pesthigo, nos Estados Unidos, em 1871, foi um dos mais graves da história, matando 1,5 mil pessoas. Nos grandes incêndios de Idaho, também nos Estados Unidos, 500 mil hectares foram devastados em 1933. Um incêndio na Austrália em 1983, que atingiu 400 mil hectares, vitimou outras 75 pessoas.

 

Fontes:

Antonelli, Diego. Paraná: Uma História. Curitiba: Arte & Letra, 2016.

SOARES, R. V.; BATISTA, A. C. Incêndios florestais – controle, efeitos e uso do fogo, Curitiba, 2007.

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